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quinta-feira, 24 de maio de 2012

A obra organística de Charles-Marie Widor


Charles-Marie Widor

C. N.

Como estou escrevendo um longo livro sobre a Música (que terminarei se Deus quiser), tenho de viajar através da obra dos compositores de todos os tempos; e não raro deparo com preciosidades em algum grau esquecidas pelo establishment da música erudita. Algumas em grau menor, como a obra sinfônica suma de Anton Bruckner; outras em grau maior, como a obra sinfônica de Franz Schmit e, agora, a obra do francês Charles-Marie Widor (1844-1937) para órgão solo (e órgão de grandes dimensões, como o das catedrais e outras igrejas da França).
Inicialmente aluno de seu pai, Charles-François (1811-1899), organista da Saint-François de Sales (Lyon), Charles-Marie Widor o substitui no orgão paroquial aos 11 anos, antes de ir estudar em Bruxelas teoria, composição e órgão. Em 1860 volta a Lyon, onde se torna organista da Saint-François. Em 1865 muda-se para Paris e assiste a Saint-Saëns na Madeleine. Em 1870 é nomeado suplente de Lefébure-Wély no órgão Cavaillé-Coll da Saint-Sulpice. É professor de órgão do Conservatório de Paris de 1890 à 1896, onde sucede a César Franck. Conta entre seus alunos organistas de renome como, entre outros, Louis Vierne, Charles Tournemire, Marcel Dupré e Darius Milhaud. Widor reforma profudamente o ensino do órgão, preconizando especialmente o conhecimento das obras de Bach e o uso racional desta arte. Virtuose do instrumento, apresenta-se em público até a idade de 90 anos. Escreveu, ademais, um tratado de orquestração concebido como complemento ao Tratado de Orquestração de Berlioz, o qual ele julgou necessário (e de fato o era) pelo progresso dos instrumentos desde a redação da obra do compositor romântico, então geralmente adotada pelos sinfonistas.
Foi autor de numerosas peças de música de câmara, de numerosas obras orquestrais (em especial o poema sinfônico La Nuit de Walpurgis, a terrível festividade pagã), de dois Concertos para piano, de um Concerto para violoncelo, de música coral sacra, etc. , etc., e especialmente de dez Sinfonias para órgão e outras peças para o mesmo instrumento.
Só conheço estas (e temo pelo referido poema sinfônico) – e pude verificar-lhes a grandeza desde a primeira audição. Se se trata de suas Sinfonias, não só são grandes, mas fundadoras. Widor é, com efeito, o primeiro sinfonista para órgão solo. Não se trata propriamente de sinfonias no sentido austro-alemão, ou seja, clássico-romântico, com seus quatro movimentos (incluso um Minueto ou, desde Beethoven, um Scherzo). As sinfonias de Widor são como uma mescla destas com as suítes francesas, e compõem-se de cinco ou seis movimentos como Prelúdio, Marcha, Meditação, Adágio, Minueto, Pastoral, Tocata, às vezes um Salve Regina, etc. Mas as duas últimas, a Gothique (para o Natal) e a Romane (para a Páscoa), são antes escritas sobre temas gregorianos, e parecem-me, junto com as duas primeiras e a quinta, as mais conseguidas.
Mas, repita-se, são todas não só fundadoras, como magníficas. E diga-se o mesmo de suas demais peças para órgão solo, notadamente a Suite Latine. Como compreender o grande silêncio a respeito deste grande compositor?
A integral de suas peças para órgão solo, escuto-as na profunda interpretação de Ben van Ooesten nos órgãos Cavaillé-Coll de St-Ouen de Rouen, St-Sernin de Toulouse, St-François-de-Sales de Lyon e Sta. María d’Azkoitia (Espanha). São 7 CDs para o selo MDG Gold.

Eis o conjunto da obra de Charles-Marie Widor: