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segunda-feira, 4 de junho de 2012

A “Sétima Sinfonia em mi maior” de Bruckner sob a regência de Claudio Abbado


Bruckner no Teatro Municipal do Rio de Janeiro

C. N.

Grata notícia: no dia 16 de junho próximo, a Orquestra Sinfônica Brasileira (OSB) se apresentará no Teatro Municipal do Rio de Janeiro às 20 horas com um programa que inclui nada menos que a magnífica Sétima Sinfonia em mi maior de Anton Bruckner. Eu infelizmente não poderei estar, mas recomendo vivamente a todos o comparecimento.
A Sétima Sinfonia é especial entre as sinfonias de Bruckner no sentido preciso de que contém o mais belo Adágio de todos os tempos. Naturalmente, a Sinfonia toda se impõe por suas dimensões majestosas e inabituais; por sua impressionante harmonia de cromatismos e alterações muito próprios que, todavia, em nenhum momento levam a peça às raias do atonalismo; pela força de suas progressões assombrosas e de efeito como que matematicamente certo; por sua instrumentação barroquizante que tão brucknerianamente evoca a escrita para órgão; e ao mesmo tempo pela surpreendente simplicidade do conjunto. Mas o longuíssimo Adágio destaca-se efetivamente. Trata-se, em verdade, de um epitáfio pela morte de Wagner (compositor cuja música Bruckner tanto admirava, sem porém entender nem minimamente o conteúdo erótico-gnóstico de suas óperas).[1] “O ápice de toda a Sinfonia”, escreve Ekkehart Kroher, “no compasso 177 (= letra W) deste movimento lento, acaba de sublinhar sua importância. Ele é precedido de um Allegro moderato em forma de sonata, cuja função, sem dúvida, ultrapassa de longe a consistente em preparar o movimento lento e em levar a ele. É construído sobre três temas, cujos perfis são muito nítidos, e cuja exposição, como sempre em Bruckner, se perde em pianissimo. O compositor constrói em seguida um desenvolvimento de grande tensão e de grande concentração contrapontística, bem como a reexposição que prepara de algum modo a pujante coda”.
Sigamos lendo Ekkehart Kroher: “O violento contraste existente entre o primeiro movimento e este Adágio se dá também entre este mesmo Adágio e o Scherzo, um movimento tripartite de caráter cantante que, certamente, é fundado sobre os intervalos naturais de quarta e de quinta puras, mas de que estão ausentes toda e qualquer referência a algum idílio da natureza e todo e qualquer parentesco com o folclore austríaco. [...] De maneira ‘vivaz mas mais rápida’, o Finale retoma enfim o início da Sinfonia por um tema de inegável parentesco (de intervalos) com o primeiro tema do movimento inicial. A contenção hesitante deste, aliás, transforma-se agora em atividade enérgica. Aqui como lá, a ação musical culmina na coda, que desta vez cita o primeiro tema do movimento inicial e associa assim, inextricavelmente, o ciclo dos movimentos.
“O fim retoma o início: a unidade interna e a lógica da ação sinfônica não podem aparecer mais nitidamente, e a soberania e a originalidade do gênio não podem revelar-se de modo mais concludente”.
As razões de tal soberania e de tal gênio, temo-las visto pouco a pouco ao longo de vários artigos neste blog. Mas ainda estou por fazer um estudo delas mais conclusivo. É o que, se Deus quiser, farei num já referido livro. Por ora, deixo-lhes, acima, um vídeo da Sétima Sinfonia em mi maior de Bruckner interpretada sob a regência de Claudio Abbado, e o estímulo a que compareçam ao Teatro Municipal do Rio de Janeiro no dia 16 próximo.


[1] Como se pode ler, por exemplo, na História da Música de Carpeaux ou na biografia de Bruckner escrita por Lauro Machado Coelho (O Menestrel de Deus). E, com efeito, dizia o insuspeito Jean Sibelius, para quem Bruckner era o maior compositor de todos os tempos e autor de sinfonias que o levavam às lágrimas: “Bruckner parecia um tonto que não entendia nada do que se passava ao redor”. Ora, tonto não podia ser em sentido absoluto, porque um tonto em sentido absoluto não seria capaz de compor as sinfonias que o levavam às lagrimas e o faziam considerá-lo o maior dos compositores. Mas “tonto”, sim, porque literalmente graças a Deus ele “não entendia” o conteúdo da música de Wagner, cujo coração, como já se disse, se devotava à morte, gnóstico que era; ficava apenas com o que de belo (e muito belo) a obra deste operista essencialmente malsão oferecia. Diga-se o mesmo, aliás, de Bruckner com respeito a todo o romantismo.